terça-feira, 28 de agosto de 2012

uma outra saudade: minha máquina de escrever


É uma pena não me lembrar da data em que ganhei minha máquina de escrever. É mesmo uma pena não tê-la dado um aniversário.  E gostaria disso porque escrever, sentindo as letras serem, assim, cravadas no papel, me faz pensar no sentimento bom de lançá-las, como flechas que se agarram ao alvo. Sim, lançá-las, golpear a pauta e poder tocar a marca do outro lado. Coisas assim perdidas com esse teclado macio, de tecnologia macia e de tela líquida. Não há aqui um desapego do moderno. Não. Sinto só não poder resgatar o dia exato em que minha mão pode tocá-la pela primeira vez – minha máquina vermelha, de segunda mão, cuidadosamente vindo à garupa do meu pai, em bolsa preta tão perfeitamente encaixada a ela - à minha, à minha, à minha máquina de escrever. Vinda de outras mãos que a deixou livre para as minhas. Eu escrevi meu nome: primeiro preto, depois vermelho . Queria eu sair datilografando como exímia datilografista, mas meus dedos lentos só sabiam namorar cada teclinha daquela, que por, muitas vezes, engoliram os pobres arrancando-lhes a cutícula. E eu soube, com minha máquina, que libertar as palavras e cravá-las no papel era difícil e, por vezes, até dolorido, mas nada poderia me fazer mais leve do que soltá-las assim, reverberando no seu estalar ansioso, um amor, uma nostalgia, um trabalho bem feito, ou mesmo só um nome, ora vermelho, ora preto.

[Fernanda]


sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Sinto saudade. Sinto, simplesmente. Sinto como vertigem ou doença crônica. Como enxaqueca. Sinto saudade. E não tem motivo certo, não tem lembrança certa. Eu só sinto: palpitando no peito, fechando a garganta, como quando o ônibus vai deixando longe os braços dos que acenam. E sinto-na como quem parte de um porto a outro todos os dias, deixando-os para trás: os dias. Acho que sinto saudade dos dias. Dias que me somam sempre que maio chega. 










[Fernanda]

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Filipe Catto


Paixão é palavra das boas. Enche a boca no dizer e, curta, deixa no som final a textura boa do xis seguido da maravilha de um a o til. E paixão alheia gera paixão na gente também, um contágio, uma ressonância. Filipe Catto, rapaz de voz de contratenor – seja lá o que isso de fato significa – me cheira transbordamento, enigma, pulso, pulso, pulso: paixão. Segue-se levado na voz, no ritmo, nos gestos de um poeta de letras firmes e vindas não se sabe de onde. Onde letras e músicas assim se fazem? E como nascem os poetas-músicos que dão às palavras vestes das mais refinadas?

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quinta-feira, 2 de agosto de 2012

é preciso silenciar muitas vezes e outras:
quando, juntas, as palavras inundam a boca
e, abraçadas, tecem um grande nó.
é que no silêncio elas se apertam
e ao invés de canto, som ou prosa
viram água e sal na face do poeta.

[Fernanda]